quinta-feira, 30 de maio de 2019

O que a coragem política requer?

Kanji japonês de coragem.
Pode dizer-me, Sócrates se a virtude é ensinada? Se não for ensinada, quem sabe seja adquirida pela prática? Talvez nem adquirida pela prática nem aprendida, e sim surgida nas pessoas por merce da natureza ou de algum outro meio?

Essa é a primeira pergunta feita por Meno a Sócrates na obra homônima (Meno) de Platão. A resposta a ela afligiu muitos filósofos durante os séculos seguintes. Segundo Aristóteles, coragem é o enfrentamento do perigo da forma certa e no momento certo. Nesse sentido, trata-se do que a honra e a reputação da pessoa exigem, por isso é pelo menos parcialmente aprendida. Mas a coragem também emerge do interior, conforme argumentaria Aristóteles se vivesse em nossos dias, e não apenas das exigências impostas pelas circunstâncias ou pelos outros.

A coragem se torna possível quando alguma coisa que o indivíduo defende, respeita, preza ou deseja com intensidade está sob considerável ameaça e raramente deriva do medo que os outros possam dizer. O medo, na verdade, dá origem à cautela. O ex-presidente americano Harry Truman disse certa vez: "Imagino até onde Moisés teria chegado se fizesse uma votação entre os judeus antes de deixar o Egito". Um dos pré-requisitos da coragem, portanto, deve ser um profundo senso do que é mais importante: um tapinha nas costas vale mais que o auto-respeito? A necessidade de agradar aos poderosos de sua empresa tem preferencia sobre o chamado da consciência? Se você não encontrar resposta a essas perguntas, a coragem será improvável, se nao impossível, porque ela não pode existir sem reflexão sobre a importância dos valores.

Os comentários transcritos abaixo são do diretor de uma empresa de confecções e demonstram o tipo de raciocínio no qual os valores estão acima de tudo para uma atitude de coragem.

Conheci dois "momentos da verdade" em minha carreira. O primeiro ocorreu no banco onde aos poucos senti que o ambiente profissional e meus valores pessoais eram incompatíveis. Eu não sabia o que fazer pois não tinha outro emprego em vista. Certo dia meu chefe comentou que precisávamos reduzir o pessoal da área de cambio exterior. Informei que essa área já contava com o número mínimo de funcionários. Ele pensou um pouco e disse: "Bom, que tal então nos livrarmos de alguns móveis e computadores?" Tenho certeza de que meu chefe não percebeu o peso de suas palavras, mas os meus olhos se abriram. A organização nivelava pessoas, móveis e computadores: todos eram bens a usar ou descartar segundo o critério da gerencia. Naquele dia eu soube que jamais voltaria a trabalhar nesse tipo de ambiente. Resolvi então levantar cinco pontos essenciais a serem considerados em meu futuro profissional. Meu compromisso era:


  • Procurar um trabalho significativo que eu aprecie.
  • Sentir orgulho da empresa para a qual viesse a trabalhar
  • Entrar em uma organização onde as mulheres compusessem pelo menos a metade do pessoal e fossem admitidas, tanto quanto os homens, nos cargos da alta administração.
  • Trabalhar em uma companhia que tivesse uma missão mais elevada e fabricasse produtos divertidos, que agregassem valor ou beneficiassem a sociedade.
  • Fazer parte de uma empresa cujos valores fossem semelhantes aos meus.

No dia seguinte, eu soube que uma organização na qual havia tempos que deseja trabalhar procurava por um executivo da minha área. Fiz contato com essa empresa, marquei uma entrevista e, após algumas semanas, comecei no novo emprego.

A coragem política está em alicerces de prioridades estabelecidas dessa maneira. No exemplo visto, a nova empresa se harmonizava com a filosofia pessoal do executivo. Além da pessoal, outras filosofias inspiradoras de coragem são a social, a organizacional e a grupal. Outro executivo que entrevistei divide suas batalhas em três categorias para guiar as próprias decisões:

1. Aquelas para as quais não me sinto muito forte, embora tenha ligeira preferencia por um resultado específico. Nesse caso, encaro a batalha como um ponto de negociação, alguma coisa que estou disposto a ceder em troca de outra.
2. Aquelas para as quais realmente me sinto forte, mas não tem relação com valores nem com questões morais. Uso nesse caso todos os dados disponíveis para reforçar meus argumentos, embora permaneça disposto a ser persuadido.
3. Conflitos sobre valores ou questões morais: é nesse terreno que apresento minhas armas e luto até a morte ou a vitória.

Uso conjunto básico de categorias como esse pode ajudá-lo a determinar as circunstancias em que a coragem é necessária.


Fonte:

Política Pessoal, Kathleen Kelley Reardon, Editora Gente.

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